Fashion Law ou Direito da Moda: a valorização da língua nacional na aplicação dos institutos jurídicos

A língua portuguesa tem sua origem dividida em cinco períodos: pré-românico, românico, galego-português, português arcaico e português moderno. Contudo, pode-se dizer que o idioma, hoje falado, guarda conexão com o período pré-românico, em sua versão conhecida pelo latim, vez que era utilizado pelos primitivos habitantes de Roma. A unificação de Portugal, ocorrida no século XIII, é considerada o marco teórico de definição do idioma e, consequentemente, a responsável pela Língua Portuguesa a ser adotada no Brasil.[1]

Sabe-se que, no Brasil, a variação linguística apresenta vasta diversidade, tanto que pesquisadores do ramo da linguística chamada de dialetologia afirmam a existência de 6 (seis) grupos de dialetos, os quais podem ser subdivididos conforme o critério regional brasileiro. Dentre os exemplos, apresentam-se os dialetos nordestino, amazônico, sulista e sudestino.[2]

Oportuno salientar que o português está na lista dos 10 (dez) idiomas mais falados do mundo, vez que aproximadamente 230 (duzentos e trinta) milhões de pessoas o adotaram em 4 (quatro) diferentes continentes. Nesse contexto, em 1986, a União Europeia o consagrou como uma das suas línguas oficiais, razão pela qual, em 1996, surgiu a CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), que tem por escopo principal a difusão e valorização do idioma. Em perspectiva semelhante, o novo acordo ortográfico, que até meados de 2019, ainda estava em processo de implementação, também busca a expansão do idioma, sobretudo com o objetivo de unificar a gramática dos países lusófonos.

Portanto, entende-se que todos os esforços viabilizam a valorização da Língua Portuguesa, fato que se mantém como imperativo de garantia do desenvolvimento econômico e social dos países lusófonos.

É relevante o fortalecimento da imagem de nação, a partir do despertar da unidade nacional, de modo que a expansão linguística desta gera reconhecimento e vitrinização mundial no processo de globalização mercantilista e reafirma a soberania desses atores internacionais.

Em exemplificação, a língua inglesa é considerada hoje universal, e, em virtude dessa notoriedade, a própria identidade linguística dos países que a utilizam exsurge como potência econômica, cultural e política e dentre outros, embora outros fatores possam ser considerados como relevantes na expansão do capital social e econômico de um país, como o patriotismo.

Nesse contexto, o Brasil carece de patriotismo, muito pela inexistência de aproximação cultural e histórica da sociedade e, principalmente, porque a “noção propagada de nacionalismo está relacionada ao ideal de um patrimônio herdado”[3] em razão do processo de Colonização ocorrido. Por isso, o povo brasileiro tem dificuldade em se reconhecer como nação, fator que leva ao favorecimento das culturas estrangeiras e à deferência aos produtos importados.

Ainda, observa-se certa resistência à ideia de formação de uma identidade nacional em virtude da “utilização propagandista das temáticas do patriotismo e do nacionalismo pela ditadura militar no Brasil”[4] que usurpou institutos tão importantes para o descrédito de tais noções. Esses obstáculos compõem um traço comportamental histórico o qual necessita ser rompido.

Afinal, desde o Brasil Colônia, evidenciou-se um processo de “bestialização” do povo, quanto ao processo político-civilizatório do país, que assistiu, de forma apática, à independência e à proclamação da República.

Nessa perspectiva, a figura de um patriotismo usurpado exsurge e, consequentemente, ainda contribui com a falta de identidade nacional. Por isso compreende-se a falta de respeito à Constituição, inclusive por parte dos representantes, vez que é essencial para uma sociedade ter sua identidade pautada na sua tradição histórica, para que haja “lealdade constitucional, que não pode ser imposta juridicamente, enraizada nas motivações e convicções dos cidadãos, só pode ser esperada se eles entenderem o Estado Constitucional como uma realização de sua própria história.”[5]

Em corroboração a essa conclusão, exemplifica-se o fato de que ”os EUA e a Suíça são duas sociedades que conseguiram um admirável grau de estabilidade”, oriunda de articulação política alicerçada, na lealdade constitucional, características que permitiram a solidificação das garantias constitucionais, além da posse sobre o processo histórico, cultural e linguístico do povo.

À vista disso, faz-se necessário o despertar do povo brasileiro para as questões nacionais, pois ‘o Brasil torna-se inglês em assunto de governo, continuando, porém, a ser o mesmo em religião, ciência, indústria, comércio e os demais pontos de relação da vida social”. Afinal, há uma “diferença nas trajetórias históricas entre os povos”[6], vez que cada nação necessita ter consciência histórica e cultural do seu povo, para que não se limite a utilizar símbolos culturais estrangeiros como bússola em desconsideração à própria realidade nacional.

Porquanto, o intuito deste artigo é demonstrar a necessidade de valorização da Língua Portuguesa, quando da aplicação dos institutos jurídicos do ordenamento pátrio, para que haja contribuição de sedimentação identitária do vocábulo como um dos principais instrumentos de representatividade cultural fortificada. Uma vez respeitada e solidificada a identidade nacional, por meio da expressão linguística, maior será o capital social, político e econômico do Brasil.

Nesse sentido, deve-se desestimular a incorporação de estrangeirismos ao vocábulo jurídico pátrio, por exemplo,“visual law”, “fashion law” e outros do gênero. Muito mais interessante que tais institutos sejam expressos em Português, sobretudo, por “restar o idioma português como objeto constitucional no Brasil”[7], conforme previsto no Art. 13 da CFRB de 1988, que aduz: “a Língua Portuguesa é o idioma oficial da República Federativa do Brasil.”

Precipuamente, é de se considerar a necessidade de fortalecer os símbolos nacionais, para que a brasilidade se propague nas vitrines de mercado internacional. Em paralelo ao Direito da Moda, é imprescindível a propagação dos símbolos nacionais, vez que, no âmbito interno, a maior parte dos atores da Indústria da Moda é composta por pessoas não bilíngues, razão pela qual a preferência por termos norte-americanizados gera distanciamento e edifica barreiras na comunicação entre os especialistas e os empresários, além do próprio mercado consumidor.

Nessa perspectiva, convém destacar “o levantamento feito pela British Council o qual mostrou que apenas 5% (cinco por cento) da população brasileira sabe se comunicar em inglês, ou seja, 10.425 (dez milhões e quatrocentos e vinte e cinco mil pessoas)  dos mais de 208 milhões de habitantes”.[8] Ressalte-se que tais indivíduos influentes estão inseridos em nichos universitários, o que justifica a necessidade de profissionais do Direito, inclusive da nova era tecnológica, de tornarem acessível os processos adquiridos por meio da globalização. Para tanto, é essencial compreender a realidade cultural brasileira, sobretudo, no setor mercadológico, pois não se pode querer transformar o cenário a partir do topo da pirâmide, mas, na base.

No plano internacional,“ é bem verdade que é muito mais difundida a terminologia Fashion Law, assim como é mais atrativo, por se tratar de um objeto internacional e universal como a Moda.”7 Entretanto, a incorporação do estudo do Direito da Moda, no vernáculo, atrai para o mercado uma visão mais nacionalista do setor e solidifica a unidade nacional que, embora pareça contraditório, comprovadamente agrada muito mais o mercado internacional, basta analisar que, apesar do Direito da Moda ter se tornado uma “tendência de estudo mundial, todavia, cada país utiliza-se da terminologia de sua língua pátria, por exemplo, na Espanha: Derecho y Moda; na Itália: Legge dela Moda; na França, Droite de La mode”. “8

       A problematização da questão do emprego de estrangeirismos no cotidiano jurídico nacional, após art. 13 da Constituição Federal, como já foi supra citado, vem no próprio Código de Ética e Disciplina da OAB[9], em seu dispositivo 29 (dentro do título de publicidade na advocacia), onde em seu inciso 6º diz:

     §6º O anúncio, no Brasil, deve adotar o idioma português, e, quando em idioma estrangeiro, deve estar acompanhado da respectiva tradução.

      Assim pode-se compreender que se há a utilização de termos estrangeiros, é obrigatório a respectiva tradução para a língua nacional. Termos como Fashion Law, já tratado anteriormente neste artigo, Tax Law, Visual Law, entre outros, estão cada vez mais comuns de serem observados, principalmente nas redes sociais.

        A fixação atual entre os advogados é o Visual Law, também conhecido como Legal Design, com o foco tornar comunicação jurídica mais acessível para o público final. Ora, se a resultante é a acessibilidade principalmente para o cliente, utilizar estrangeirismos é uma forma de criar uma lacuna entre o profissional e o propenso cliente brasileiro.

         O direito precisa ser compreensível para promover o acesso à justiça, isso é, não apenas para aquele advogado, mas para todas as figuras representadas na relação jurídica, tais como: cliente, advogados, judiciário, etc. A língua portuguesa já é complexa o bastante para o emprego de tantas palavras importadas de outras culturas, tendo em vista que existem mais de 5.000 verbos.

         Caso completamente diferente dos demais já abordados, de quando  se é necessário o emprego de línguas estrangeiras no cotidiano processual, tais como documentos originários de línguas diversas ao português, mas ora neste trabalho trata-se de provas para o desenvolvimento do processo. Essa tradução é realizada por um tradutor juramentado e somente realizada assim é reconhecida oficialmente por instituições e órgãos públicos diversos no Brasil e tem validade como documento oficial ou legal.

Portanto, se perfaz urgente a valorização da Língua Portuguesa na incorporação dos institutos jurídicos ao ordenamento pátrio.

REFERÊNCIAS

ALVES, Dayane Nayara. Impactos Econômicos e Sociais da Pirataria na Indústria da Moda. Lumén Juris: Rio de Janeiro, 2021.

BAGNO, Marcos. Preconceito Linguístico. Loyola: São Paulo, 1999.

BARRETO, Tobias. A Questão do Poder Moderador e outros ensaios brasileiros. Petrópolis: vozes; Brasília, 1977.

CAVALCANTI, Antônio Cavalcanti. Diversidade cultural, identidade nacional brasileira e patriotismo Constitucional. Disponível em: http://www.casaruibarbosa.gov.br/dados/DOC/palestras/Diversidade_Cultural/FCRB_ DiversidadeCulturalBrasileira_AntonioCavalcanti.pdf . Acesso em: 28.mai 2021.

COLAÇO, Hian Silva. Separação de Poderes na Constituição Imperial: a questão do Poder Moderador como epicentro dos dilemas do pensamento constitucional. In: Mont´Averne, Martônio(org). Temas de Direito Constitucional Brasileiro. Lumen Juris; Rio de Janeiro, 2016.

DIANA, Daniela. História da Língua Portuguesa. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/historia-da-lingua-portuguesa/. Acesso em: 26. mai 2021

HABERMAS, Jürgen. Communication and the Evolution of Society. Boston: Beacon Press, 1979.

COELHO, Lilian. Visual Law: o que é e como pode transformar a sua advocacia. Disponível em:

https://www.aurum.com.br/blog/visual-law/#:~:text=Visual%20Law%20%C3%A9%20uma%20solu%C3%A7%C3%A3o,points%2C%20%C3%ADcones%2C%20entre%20outros. Acesso em: 26.mai 2021.

BRASIL. Código de Ética e Disciplina. Disponível em: https://www.oab.org.br/content/pdf/legislacaooab/codigodeetica.pdf.

Por:

Dayane Nayara Alves – Mestra em Direito Econômico e Desenvolvimento pela UCAM-RJ. Especialista em Direito Fiscal pela PUC-RJ. Especialista em Fashion Law pela FASM-SP. Extensão em Fashion Law pela UERJ.

Isabella Pari Bortoloti – Advogada especialista em Direito Processual Civil e Empresarial. Pós-graduanda em Direito do Consumidor. Cursos de Extensão em: Fashion Law: Modelos de Negócio e Proteção de Propriedade Intelectual pela FAAP, Lei Geral de Proteção de Dados, Propriedade Industrial e Práticas Modernas no Direito do Consumidor pelo Damásio Educacional.

Presidente da Comissão de Estudos em Direito da Moda Da 38ª Subseção de Santo André – OAB/SP.


[1] BAGNO, Marcos. Preconceito Linguístico. Loyola: São Paulo, 1999.

[2] https://www.todamateria.com.br/historia-da-lingua-portuguesa/.

[3] HABERMAS, Jürgen. Communication and the Evolution of Society. Boston: Beacon Press, 1979.

[4] http://www.casaruibarbosa.gov.br/dados/DOC/palestras/Diversidade_Cultural/FCRB_ DiversidadeCulturalBrasileira_AntonioCavalcanti.pdf

[5] BARRETO, Tobias. A Questão do Poder Moderador e outros ensaios brasileiros. Petrópolis: vozes; Brasília, 1977.

[6] COLAÇO, Hian Silva. Separação de Poderes na Constituição Imperial: a questão do Poder Moderador como epicentro dos dilemas do pensamento constitucional. In: Mont´Averne, Martônio(org). Temas de Direito Constitucional Brasileiro. Lumen Juris; Rio de Janeiro, 2016.

[7] ALVES, Dayane Nayara. Impactos Econômicos e Sociais da Pirataria na Indústria da Moda. Lumén Juris: Rio de Janeiro, 2021.

[8] ALVES, Dayane Nayara. Impactos Econômicos e Sociais da Pirataria na Indústria da Moda. Lumén Juris: Rio de Janeiro, 2021.

[9] https://www.oab.org.br/content/pdf/legislacaooab/codigodeetica.pdf.

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