Pais, vocês são responsáveis pelos atos de seus filhos na internet!

Por Guilherme Cunha Braguim, Luciana Ferreira Bortolozo e Renata Yumi Idie

 

O uso da internet por crianças e adolescentes cresce a cada ano, segundo pesquisa realizada pela Cetic.br com crianças e adolescentes com idade entre 09 e 17 anos. No ano de 2014, 21% dos entrevistados admitiram acessar a Internet mais de uma vez por dia[1], enquanto em 2016 esse percentual foi de 69%[2]. A mesma pesquisa verificou que a maior parte dos entrevistados realizaram o primeiro acesso com até 10 anos[3], sendo que 78% utilizam a internet para acesso a redes sociais[4], ambiente que permite uma ampla interação entre os usuários.

Em contrapartida com a vasta utilização da Internet por crianças e adolescentes, a pesquisa demonstrou que, em média, cerca de 50% dos pais ou responsáveis regulam de alguma maneira o uso da Internet pelos entrevistados[5]. Acontece que essa ferramenta nem sempre é utilizada para o bem e grande parte das escolas não oferece educação digital também aos pais, professores e, principalmente, aos  alunos.

Neste sentido, são inúmeros casos envolvendo o uso indiscriminado da internet por menores e que geram consequências graves ou permanentes. Atualmente estão em pauta os casos relacionados à cyberbullying (assédio virtual) e revenge porn (pornografia de vingança), bem como atos de discriminação e preconceito, atitudes graves que merecem atenção em razão dos reflexos psicossociais e que também podem trazer reflexos em âmbito jurídico.

Isto porque os atos praticados na Internet podem acarretar em responsabilização dos seus agentes em âmbito cível e criminal, a depender da conduta. No caso, por exemplo, da prática de cyberbullying, além dos reflexos cíveis (danos morais/patrimoniais), as ofensas podem caracterizar a prática de crimes contra a honra e até mesmo de ameaça, de modo que os perseguidores poderão ser responsabilizados.

Acontece que os menores de 18 (dezoito) anos são civil e penalmente inimputáveis, surgindo a responsabilidade dos pais, nos moldes do previsto no artigo 932, do Código Civil:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:

I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua  companhia;

O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do Recurso Especial nº 1.436.401, entendeu que o termo “autoridade” a que se refere o artigo citado do Código Civil explicita o poder familiar: “O art. 932, I do CC ao se referir a autoridade e companhia dos pais em relação aos filhos, quis explicitar o poder familiar (a autoridade parental não se esgota na guarda), compreendendo um plexo de deveres como, proteção, cuidado, educação, informação, afeto, dentre outros, independentemente da vigilância investigativa e diária, sendo irrelevante a proximidade física no momento em que os menores venham a causar danos.”

Dessa forma, os pais possuem o dever de cuidar, proteger e fornecer informação aos seus filhos, evitando assim que pratiquem infrações e crimes através da internet. Caso contrário, são responsáveis pela reparação civil de eventual dano causado pelo menor, vez em que cabe aos pais o dever de vigilância (culpa in vigilando).

Em âmbito criminal, por sua vez, as crianças, quando praticam ato que configure um crime ou contravenção penal, estarão sujeitas às medidas indicadas no artigo 101 do Estatuto da Criança e Adolescente, que prevê, entre outros, a requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, orientação, apoio e acompanhamentos temporários e até acolhimento institucional.

Quanto aos adolescentes, o artigo 112 do mesmo Estatuto prevê advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade, internação em estabelecimento educacional para atos infracionais, entre outros.

Assim, é de suma importância que as crianças e adolescentes sejam cientificados dos riscos associados ao uso da tecnologia para evitar que futuramente se encontrem na condição não só de vítima como também de ofensor, sendo essencial a sua orientação para que façam uma utilização consciente das ferramentas que estão ao seu alcance, cabendo esse papel não somente às escolas, como também aos pais e responsáveis.

Neste sentido, cabe destacar a iniciativa da Nethics (www.nethicsedu.com.br), empresa voltada à educação de crianças e adolescentes sobre o uso ético e seguro da Internet. A empresa indica que crianças menores de 7 anos sejam incentivadas à conviver mais com o mundo offline, e a eles seja transmitida a importância de brincar pessoalmente com os amigos, praticar esportes e não ficar muito tempo na frente da TV ou videogame. Para essa faixa etária, a navegação na internet tem que sempre ser acompanhada e direcionada pelo pai ou responsável.

A Nethics aponta que, entre 8 e 12 anos, as crianças tornam-se mais ansiosas para fazer parte de redes sociais. Nessa faixa etária é importante que os responsáveis não sejam omissos, nem tampouco incentivem as crianças a mentirem sua idade para serem aceitas nas redes sociais.

Iniciando sua vida nas referidas redes, é importante que as crianças sejam instruídas para não interagirem com estranhos e jamais compartilharem informações pessoais. Uma relação de confiança deve ser estabelecida entre pais e criança, para que a criança possa reportar casos estranhos que acontecem na navegação. O ideal é estipular regras rígidas sobre horários e limites.

A partir dos 13 anos as crianças e adolescentes podem, por exemplo, ter um cadastro “lícito” no Facebook. Esse momento é a hora de conversar sobre tudo, principalmente sobre o fato de que a internet não é “terra sem lei”, e que é possível ser responsabilizado pelos atos online. É importante que as crianças também tenham consciência de que suas atitudes podem trazer consequências jurídicas para os seus pais e a si mesmo, pois, na internet, tudo que é escrito está escrito para sempre, e não será esquecido.

É importante também conscientizar as crianças de que não é correto divulgar dados íntimos ou imagens comprometedoras, sejam de si mesmo ou de amigos e conhecidos.

A participação intensa dos pais na vida social dos filhos é essencial, pois permite que sejam detectados comportamentos diferentes dos usuais e as novas amizades dos filhos, as quais podem trazer influências negativas, caso em que devem ser imediatamente cortadas.

Em suma, é extremamente relevante que os pais se envolvam diretamente na educação cibernética de seus filhos, passando valores éticos e morais aos jovens e lhes transmitindo a noção de responsabilidade desde cedo. Ainda, as crianças devem conhecer os riscos de suas atitudes, e entender o valor de sua privacidade, de seus pais, de seus amigos e colegas.

Dessa forma, estimula-se uma convivência sadia e benéfica para todos os diretamente e indiretamente ligados às atitudes dos jovens, além deles próprios, o que se faz primordial para que as crianças cresçam de maneira sadia, positiva e longe de preocupações com suas atitudes, sejam online ou offline.

 

Guilherme Cunha Braguim é advogado especializado em Direito Digital e Segurança da Informação no escritório Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados, bacharel em direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, especialista em Propriedade Industrial e Direito Autoral pela Escola Superior de Advocacia da OAB.

Luciana Ferreira Bortolozo é advogada no escritório Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados, graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, pós graduada em Processo e Direito Civil pela Escola Paulista de Direito e especialista em Direito Digital e Propriedade Intelectual, com ênfase em Direitos Autorais pela WIPO e Universidade de Genebra.

Renata Yumi Idie é advogada associada no escritório Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados, especialista em Propriedade Intelectual pela Escola Superior da Advocacia da OAB/SP.

 

 

[1] http://cetic.br/tics/kidsonline/2014/criancas/A4/, acesso em 29.11.17.

[2] http://cetic.br/tics/kidsonline/2016/criancas/A4/, acesso em 29.11.17.

[3] http://cetic.br/tics/kidsonline/2016/criancas/A3/, acesso em 29.11.17.

[4] http://cetic.br/tics/kidsonline/2016/criancas/B1/, acesso em 29.11.17.

[5] http://cetic.br/tics/kidsonline/2016/criancas/E3/, acesso em 29.11.17.

 

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