Desafios jurídicos no metaverso

Sumário

  1. Evolução social e novas tecnologias
  2. Uma breve menção às inteligências artificiais
    2.1. Estratégia Nacional de Inteligência Artificial (EBIA) no Brasil
  3. O que é metaverso?
    3.1. Metaverso imobiliário
  4. NFTs, um novo mercado
  5. Criptofashion
  6. Propriedade industrial e intelectual
  7. Desafios jurídicos
  8. Referências Bibliográficas

1. Evolução social e novas tecnologias
A sociedade está em constante evolução, diariamente surgem inovações e novas tecnologias no mercado. Devido ao rápido desenvolvimento, muitas vezes não é possível analisar com cautela quais seriam seus benefícios, os fatores que podem facilitar a vida humana e até mesmo, em contrapartida, se poderiam causar riscos ou quais seriam suas problemáticas.
Dois termos que ganharam destaque nos últimos anos são (i) Inteligência Artificial (IA) e (ii) Metaversos.
Segundo pesquisa recente do Instituto Kantar Ibope Mediai, cerca de 6% dos brasileiros com acesso à internet já tiveram alguma interação no metaverso, equivalendo a, aproximadamente 4,9 milhões de pessoas.
Ainda, de acordo com o relatório The Art of Customer-Centric Artificial Intelligence: How organizations can unleash the full potential of AI in the customer experience, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Capgemini, o Brasil é o segundo país com mais interações diárias com inteligências artificiais, chegando a índices de 64%.
Essa alta procura pelas novas tecnologias vai além da simples curiosidade. Para o mercado financeiro, os altos valores de investimentos por parte das grandes empresas multinacionais, é um dos principais atrativos para pesquisas e desenvolvimentos de aprimoramentos em plataformas de IA, metaverso ou até mesmo ambas, em conjunto.
E onde o Direito entra com esses avanços? Nas palavras da advogada Patricia Peckii:
“(…) nos encontramos em uma situação de transição, de mutação do Direito, em que a falta de adequação dos processos jurídicos e dos seus profissionais gera ainda mais incerteza, insegurança quanto a capacidade de vivermos em um estado de legalidade. É por isso, que surge o Direito Digital, com uma abordagem mais estratégica e uma visão mais ampla do Direito com respostas para as questões atuais que mais têm gerado polêmica e que são fruto da nova realidade social (…)”
Por isso, os novos profissionais, operadores do direito, devem estar atentos aos avanços das tecnologias, assim como a sociedade evolui, também a acompanha, o direito.

2. Uma breve menção às inteligências artificiais
Antes de se discutir sobre inteligências artificiais (IAs), é necessário entender qual seu conceito e funcionalidade no contexto social.
Sobre IA, temos a definição da empresa texana Hewlett Packard Enterprise: “O termo ‘inteligência artificial’ representa um conjunto de software, lógica, computação e disciplinas filosóficas que visa fazer com que os computadores realizem funções que se pensava ser exclusivamente humanas, como perceber o significado em linguagem escrita ou falada, aprender, reconhecer expressões faciais e assim por diante. O campo de IA tem um longo histórico, com muitos avanços anteriores, como reconhecimento de caracteres ópticos, que agora são considerados rotina.”
Acerca do referido conceito, constata-se que as IAs podem desempenhar um papel de extrema relevância para a sociedade, entretanto algo tão deve ser introduzido à humanidade com cautela.
Estudos mostram que as IAs podem possuir capacidade ilimitada de conhecimento, podendo chegar a patamares inimagináveis, sobrepondo, com sobras, aos limites cognitivos do ser humanoiii.
Conforme o Centro de Estudos de Riscos Existenciais, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, muitas IAs ainda são desenvolvidas para resolver um problema pontual, sem que haja seu desenvolvimento para outras áreas, a título de exemplificação o que ocorreu com o computador “Deep Blue”.
Desenvolvido em 1997, a máquina foi elaborada com o intuito de obter algoritmos e uma base de dados robusta para enfrentar o então campeão mundial de xadrez, Garry Kasparov. O projeto foi bem sucedido, quando a máquina venceu em uma série 6 (seis) jogos.
Quando uma IA é desenvolvida para uma determinada função, o que se espera é que ela não consiga desenvolver outra função se não a qual foi designada, isso porque sua base de dados é elaborada especificamente para processar uma informação.
Algo diferente ocorreu com o sistema AlphaGo Zero que, de modo “autodidata”, aprendeu a decifrar códigos em um curto espaço de tempo apenas utilizando um software consigo mesmo. O sistema aprendeu os códigos através de um conjunto de redes neurais artificiais não necessitando do auxílio da programação humana.
O Centro de Estudos de Riscos Existenciais menciona:
“À medida que um sistema de inteligência artificial se torna mais poderoso e mais geral, ele pode se tornar superinteligente, algo superior ao desempenho humano em muitos ou quase todos os domínios”.
Segundo o Chief Information Officer (CIO) no Gartner’s 2019 CIO Agenda Survey, entre 2018 e 2019 o número de empresas que passaram a implementar a I.A. em seu contexto foi de 4% para 14. Ocorre que a mesma pesquisa apontou que o percentual esperado para 2018 era de 21%, o indicando que a implementação desta tecnologia não é tão simples.

2.1 Estratégia Nacional de Inteligência Artificial (EBIA) no Brasil
Em abril de 2021, com o auxílio de diversos setores voltados para o desenvolvimento no Brasil, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) elaborou um documento para orientar as políticas públicas relacionadas à introdução das Inteligências Artificiais no país.
A EBIA (Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial) tem como seus princípios basilares os seguintes pontosiv: a contribuição para a elaboração de princípios éticos para o desenvolvimento e uso de IA responsáveis, a promoção de investimentos sustentados em pesquisa e desenvolvimento em IA, a remoção de barreiras à inovação em IA, a capacitação e formação de profissionais para o ecossistema da IA, a estimulação para a inovação e o desenvolvimento da IA brasileira em ambiente internacional, e a promoção de um ambiente de cooperação entre os entes públicos e privados, a indústria e os centros de pesquisas para o desenvolvimento da IA.
O documento foi elaborado para direcionar para as ações do governo federal, para o estímulo da pesquisa, inovação e desenvolvimento de soluções em Inteligência Artificial, que deve ser sempre ser feita de forma consciente e ética.
Como menciona a (EBIA, pg. 8) “são visíveis os impactos da Inteligência Artificial sobre inúmeros setores da vida humana, com alteração dos paradigmas atuais da produção industrial, das relações pessoais e do cuidado com a vida. A Inteligência Artificial possui diversas ramificações que podem ser usadas de forma complementar ou dissociadas uma das outras, tais como: aprendizado de máquina (machine learning), robótica, processamento de linguagem natural, reconhecimento de voz e reconhecimento de imagens. Neste documento, todos esses termos serão englobados pelo conceito geral Inteligência Artificial”.
Assim, vemos que a EBIA objetiva a introdução de forma estratégica, avaliando os impactos e sempre preservando o fator humano. Tal objetivo também é visto no setor privado, que baliza as diretrizes dessa implementação com base na receptividade pela sociedade.
Nos dizeres de Andriei Gutierrez, diretor de relações governamentais e assuntos regulatórios na IBM Brasil, em entrevista concedida ao InternetLab, pesquisa em direito e tecnologia, em 2020:
Como setor privado, nós temos que começar a discutir (…) a responsabilidade de algoritmo, que passa por definir um padrão ético para adoção, pela preocupação de como os algoritmos vão ser desenvolvidos, usados e vão voltar a ser reproduzidos na sociedade. (…) Nós temos que nos reeducar à luz dessa nova era. (…) Vai ser um processo de educação, de formação política: vamos ter que rediscutir valores, privacidade; questionar para quem estamos dando os dados…”

3. O que é metaverso?
Embora as discussões sobre o tema tenham sido exponencialmente maiores nos últimos meses, desde a decisão do CEO do Facebook (Mark Zuckerberg) de alterar o nome de sua empresa para Meta, o conceito de metaverso é muito mais antigo. Isso porque as primeiras conversas e estudos iniciaram-se em 1992.
O escritor Neal Stephenson, em seu livro Snow Crash (1992) foi quem trouxe a primeira definição para metaverso:
“Metaverso é uma rede persistente de mundos e simulações renderizadas em tempo real e 3D, que oferecem identidade contínua a objetos, história e direitos, que podem ser experimentados de forma síncrona por um número ilimitado de usuários, cada um com sua presença individual.”
Neal discorreu sobre a possibilidade de pessoas criarem avatares para navegar em um mundo virtual, 3D, que facilmente se confunde com o mundo real, muito em razão da fácil interação social dentro deste universo.
Em 30 anos muitas novas tecnologias surgiram, possibilitando que o metaverso ficasse cada vez mais próximo de nossa realidade. Porém, ainda faltam recursos para que ele possa se materializar, por isso para esclarecer e fixar a ideia do metaverso, como um “ponto de partida” existem quatro conceitos basilares que precisam ser entendidos, sendo eles: (i) realidade virtual (RV), (ii) realidade aumentada (RA), (iii) realidade mista (RM) e (iv) web 3.0.
Dos conceitos acima, a RV é de longe a mais comum nos dias de hoje, qualquer pessoa com o mínimo acesso à internet já ouviu falar ao menos uma vez em algum dispositivo de RV, como exemplo o Oculos Rift, Samsung Gear VR, Sony Playstation VR e HTC Vive Pro.
A RV é que um ambiente 100% digital, 3D, criado por um computador (os dispositivos citados são alguns exemplares disponíveis no mercado) que simula o mundo real e permite que pessoas interajam com o conteúdo apresentado, como objetos, paisagens e até mesmo outros avatares.
Diferente da RV, a qual de fato cria um ambiente virtual, completamente independente do mundo real, a RA apenas mistura o mundo real com projeções virtuais que criam uma realidade diferente, mas dependente de objetos e ambientes reais.
Um exemplo claro de RA é o famoso jogo para celulares smartphones Pokémon GO. Este aplicativo projeta na tela dos celulares uma imagem do mundo real, mas com uma mescla do mundo virtual, onde mostra para os usuários os “bichos” que podem ser capturados também com uma ferramenta virtual denominada “pokebola”.
Apesar de muito utilizada, a RA ainda é extremamente limitada considerando seu potencial. Estima-se que, no futuro, serão possíveis interações reais com virtuais sem que o usuário necessite de um dispositivo como o celular. Isso ficou mais evidente após o anuncio, em setembro de 2021, feito por Mark Zuckerberg que lançou um óculos de sol com realidade aumentada em parceira com a Ray-Ban, EssilorLuxotticav. O óculos permite que os usuários ouçam música, atendam ligações ou tirem fotos e vídeos curtos e os compartilhem nos serviços do Meta.
A princípio a ideia destes óculos pode parecer simples e superficial, mas o que está por trás dessas funções é ensinar a IA a como a interação humana com os objetos, pessoas e ambientes funciona. Uma vez que a IA aprender com os costumes humanos a como as pessoas interagem, será possível um auxílio maior e mais exato a como agir com situações cotidianas da melhor maneira.
Já a RM, por sua vez, é uma junção da RV com a RA, que permite uma interação perfeita com os objetos no mundo real através de projeções virtuais, exemplificando, seria como hologramas que geralmente são apresentados em diversos filmes sobre o futuro. Desde reuniões de trabalho até compra e venda de produtos podem ser viabilizadas no metaverso por meio da RM.
Assim, surge o quarto e último conceito chamado de web 3.0, trazendo a ideia de uma nova internet que possibilita que os usuários, construtores e proprietários dessas plataformas sejam as mesmas pessoas, as descentralizando.

3.1 Metaverso imobiliário
Para muitas pessoas, seria impossível imaginar a ideia de comprar um terreno ou uma casa, que não existe no mundo real, desembolsando valores exorbitantes, mas com os avanços e a popularização, ainda que lenta, das plataformas de metaverso, essa ideia vem se tornando cada vez mais possível.
Robinson Silva, Head do GRI Club Real Estate Brazilvi, traz que são três os principais motivos que explicam o interesse que vem surgindo por parte dos investidores, sendo eles: a especulação imobiliária e a valorização do terreno no futuro, a possibilidade de compra de terras para locação e realização de eventos dentro do metaverso, e, a oportunidade de se criar negócios que geram receitas e podem se tornar cada vez mais rentáveis.
Apesar de ser um mercado aquecido e da ideia de adquirir um terreno virtual parecer muito interessante, a compra e venda dentro de uma realidade virtual pode envolver muita burocracia, isso porque alguns aspectos jurídicos ainda precisam ser adaptados, segundo Fernando Zilveti, tributarista da Zilveti Advogados.
“É preciso estar ciente dos direitos imobiliários ao comprar ou vender um imóvel. O processo é menos demorado do que no mundo real e físico, mas ainda é preciso ter cuidado. Não existe ainda uma legislação. O que acontece é uma aquisição que faz parte da compra e venda de direitos através de regulamentação do código civil”.
Outros aspectos jurídicos podem gerar dúvidas e serem arriscados para aqueles que desejam adquirir bens em qualquer plataforma de metaverso, como exemplo a tributação das transações, a validade dos contratos firmados dentro da plataforma e até mesmo a aplicação do direito consumerista em eventuais danos causados.

4. NFTs, um novo mercado
O novo mercado do momento é o chamado Non Fungible Token (NFT), que em tradução literal seria um “Token não Fungível”. Rapidamente, bens infungíveis são aqueles que não podem ser substituídos por outros da mesma espécie, por possuírem uma característica própria, que a torna individual, como um quadro, por exemplo.
O NFT possibilita a transformação de qualquer categoria de mídia digital — seja um GIF, imagem, vídeos, mensagens, músicas ou ativos reais como roupas — em um bem infungível. Em março de 2021, o CEO da rede social twitter vendeu seu primeiro tweet por cerca de 2,9 milhões de dólares, segundo informou o site infomoney em entrevista feita pela Reutersvii.
Como todo bem, é necessário que seja armazenado em algum local, no caso dos NFTs este local se chama Blockchain. O sistema permite que seja realizado o rastreio, envio e recebimento de informação pela internet. Funciona como “pedaços” de um código gerado online carregando informações conectadas. É através dele que as transações das criptomoedas são possíveis.
Em 2008, no artigo acadêmico Bitcoin: um sistema financeiro eletrônico peer-to-peer de autoria de Satoshi Nakamoto (suposto criador do bitcoin), foi apresentado pela primeira vez o conceito do Blockchain que seria: “uma rede que marca o tempo das transações, colocando-as em uma cadeia contínua no ‘hash’, formando um registro que não pode ser alterado sem refazer todo o trabalho”.
A ideia de Satoshi foi criar uma tecnologia para que o bitcoin pudesse existir, e, em consequência acabou possibilitando que seu uso fosse muito além das transações em criptomoedas.
Para adquirir uma NFT é necessária uma moeda virtual. Assim como para o dinheiro físico ou cartões, as moedas virtuais também possuem uma carteira própria, as denominadas e-wallets. Foram criadas em 2018 e, desde então só aumentaram o número de usuários, tendo um grande crescimento no primeiro trimestre de 2019, quando o seu uso aumentou em 65%viii.
A e-wallet possibilita as transações no Blockchain. Ela possui um “ID” (uma sequência aleatória alfanumérica) para garantir a segurança das informações e guarda suas criptomoedas e NFTs. Existem diversas categorias de provedores de e-wallets no mercado como o Metamask (o mais popular e acessível), Fortmatic, Coinbase e o Rainbow.
Segundo o “Blockchain User Behavior Report”ix, o Brasil apesar da queda para Índia, no nível de engajamento no mercado de NFTs ocupa atualmente o 3º lugar no ranking de países com participação neste mercado.
O mesmo estudo mostrou que, em 2021, no terceiro trimestre o mercado de NFTs movimentou cerca de US$ 10,7 bilhões e no quarto trimestre, US$ 11,9 bilhões. Apesar da indecisão e variação dos preços das criptomoeadas, no início de 2022, o OpenSea, um dos maiores marketplaces de NFTs do mundo, já superou seu recorde de transações mensais, de US$ 3,5 bilhões.

5. Criptofashion
Um dos mercados que mais vem crescendo, utilizando-se de NFTs, é o da moda, também conhecida como criptofashion. Essa cultura vem se disseminando desde dezembro de 2019 no metaverso chamado Decentralandx e tem atraído empresas como Gucci, Burberry, Chanel e Louis Vuitton.
Os usuários do metaverso buscam peças únicas para seus avatares gastando milhares de dólares em itens em NFT. O modelo Imani McEwan, relatou ao G1 que já gastou cerca de US$16 mil em 70 itens de moda em NFT, usando o lucro de investimentos em criptomoedasxi.
Assim como Imani, o artista Hiroto Kai (Noah) investe em moda via NFT, mas, em seu caso, ele é o desenvolvedor de peças de roupas exclusivas. Em entrevista à Reuters no dia 26 de agosto de 2021xii, Hiroto descreve a criptofashion como uma “arte em movimento” e relata, ainda, que se demitiu do seu antigo emprego para se dedicar à produção das roupas, que vende por volta de US$140 cada, faturando de US$15 mil a US$20 mil em 3 semanas.
Segundo a plataforma de análises do Decentraland, a Non Fungiblexiii, cerca de US$2.051.267.477,59 já foram gastos em artes ou moda em NFT apenas no ano de 2021, valores gerados a partir das 493.355 vendas.
Existem diversas plataformas de marketplace para os conteúdos em NFTs, a mais conhecida delas é a Rarible. A plataforma possui como sua principal criptomoeda a Ethereum, que na atual cotação está avaliada em R$22.555,77xiv e trabalha também com a Tezos e Flow.
Como qualquer outro marketplace, a Rarible expõe em sua plataforma o conteúdo de terceiros, logo, alguns questionamentos podem surgir, como, por exemplo, questões voltadas aos direitos autorais e intelectuais dos titulares dos conteúdos em NFTs.
Para isso, em seus termos de usoxv, a Rarible dispõe diretrizes, com base no Digital Millennium Copyright Act (DMCA) dos EUA, a serem seguidas em caso de violação de direitos autorais, sendo: (i) envio de uma assinatura física ou eletrônica do detentor do direito autoral, ou pessoa autorizada por ele, (ii) identificação clara do direito autoral infringido, (iii) identificação online do conteúdo infringido, incluindo, se possível, a URL na plataforma, (iv) informações para contato da plataforma (e-mail, endereço, telefone), (v) um termo de boa-fé que demonstre que o conteúdo está sendo utilizado sem autorização, e (vi) um termo feito sob perjúrio que as informações alegadas são verdadeiras.
Ainda na questão dos direitos autorais, os NFTs criaram um mercado para artistas ou marcas realizarem licenciamento e aumentarem seu patrimônio, isso porque através desta tecnologia é possível ter melhor poder de gerenciamento sobre as obras e bens comercializadas no ambiente virtual.
Como pontua Adrian Kemmer Cernev, professor de blockchain e criptoativos da ESPM-SP:
“O grande fundamento econômico do NFT é a raridade. Se consigo provar que aquele artigo digital é raro e algumas pessoas querem concorrer para ter aquele artefato único, existe um valor econômico desse bem. Quanto vale uma garrafinha da Coca-Cola? E se ela for da década de 1950? Não é nem a questão da idade, é o apreço que temos pelo produto. O NFT conseguiu criar o conceito de escassez, raridade no ambiente digital, que antes não existia e era dominado pelo famoso ‘control C + control V’, originando um novo mercado também”.

6. Propriedade industrial e intelectual
Um dos grandes atrativos no metaverso são a rápida difusão e propaganda das marcas, bem como a facilitação ao acesso por parte dos consumidores.
Sabendo que nas plataformas os usuários buscam inovações, investir no marketing de uma marca pode trazer diversos benefícios financeiros e reputacionais para uma empresa. Contudo, a marca deve estar previamente registrada perante um órgão responsável por suas concessões.
No Brasil, este órgão é o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), que tem como fonte principal de direito a Lei n° 9.279/1996 (LPI).
Em seu art. 139 a LPI dispõe que “Art. 139. O titular de registro ou o depositante de pedido de registro poderá celebrar contrato de licença para uso da marca, sem prejuízo de seu direito de exercer controle efetivo sobre as especificações, natureza e qualidade dos respectivos produtos ou serviços”. Ou seja, a marca registrada pode ser explorada comercialmente por outras sem que o titular perca sua exclusividade de registro.
Diversos são os benefícios do licenciamento, como exemplo o pagamento de royalties pelo uso do nome ou logo de uma marca.
É comum vermos empresas, principalmente do ramo da moda, que fazem collabs com outras a fim de se promoverem e criarem maior engajamento com seus respectivos consumidores. Segundo o Glossy Research Panel, em 2019, nos Estados Unidos, 38% dos 149 executivos entrevistados pretendiam realizar collabs com o intuito de abrir caminho para novos públicos.
Além do mais, investir em uma boa estrutura mitigando riscos da empresa em questões voltadas à Propriedade Intelectual, com o auxílio de profissionais do direito qualificados, pode ser o principal ponto para diferenciar quais marcas estão pensando de fato no futuro e quais ainda não conseguiram se adaptar.
Surge daí um novo ramo de atuação tanto para advogados ou operadores do direito que estão iniciando suas carreiras e desejam investir em novas tecnologias, quanto para aqueles que já estão há tempos no exercício da profissão, mas querem adequar suas expertises ao novo momento do mundo.
Assim, somando as experiências dos novos profissionais do direito, com o intuito de alavancar os negócios por parte das empresas, o resultado é um universo onde todos são favorecidos, isso porque boas adequações podem auxiliar não só aqueles que desejam angariar mais fundos com suas marcas no metaverso, mas também aproximar os consumidores finais através da credibilidade de mercado.

7. Desafios jurídicos
O direito acompanha a sociedade na medida em que ela se desenvolve, com novas ideias e criações, surgem novas problemáticas, como a identidade virtual.
Na era digital, é comum que pessoas passem a se preocupar cada vez mais com suas identidades virtuais, sendo tão, ou às vezes mais, importante que a real.
Cria-se uma reputação através da identidade virtual, onde pessoas passam a atribuir valores a atitudes e posicionamentos feitos no mundo cibernético, como acontece em postagens nas redes sociais. Há até mesmo quem passe por treinamentos sobre o que se deve ou não postar e como comentar determinado assunto.
Quando se fala em metaverso, que possibilita uma interação maior entre as pessoas, a preocupação com a identidade visual aumenta ainda mais, isso porque esses ambientes criam uma profunda dependência das pessoas.
Como já mencionado, a interação dos usuários dessas plataformas se dá através da criação de um avatar sendo o representante virtual do ser humano no metaverso. Podem ser uma foto da própria pessoa, um boneco em 3D baseado em seu usuário, com dimensões e jeitos similares ou diferentes ao do ser humano que o criou.
O avatar proporciona um sentimento de segurança ao usuário que o criou, pois está “protegido” em um mundo onde a interação humana é apenas digital. A sensação de que uma tela ou dispositivo eletrônico protege o usuário é muito poderosa tornando a interação com outros avatares mais fácil.
Mais de 75% dos usuários se sentem seguros ao utilizar o avatar, embora essa segurança não exista de fato. Ocorre que essa suposta proteção acaba deixando o usuário mais exposto, facilitando que suas atitudes sejam mal interpretadas e até mesmo propagando discursos que podem ser perigosos para a sociedadexvi.
Alguns usuários dos metaversos investem tempo e dinheiro real para criar seus avatares que representam suas vidas em um jogo online, por exemplo.
A discussão acerca da exclusão de perfis já foi levada ao judiciário. Recentemente, em 2021, a juíza Andrea Maciel Pachá, da 32ª vara Cível do RJ, negou pedido de indenização de 17 usuários contra o jogo online Tibia e contra o portal Uolxvii, em sentença a magistrada entendeu que:
“Por mais que se compreenda a importância que jogos virtuais ocupem na contemporaneidade, não se pode dar a dimensão existencial pretendida pelos autores ao aborrecimento experimentado com a exclusão ou banimento de um mundo paralelo e imaterial.”
Neste caso específico, os autores não teriam comprovado a real titularidade das contas nem tampouco a indevida exclusão delas, o que acarretou no indeferimento do pedido.
Ainda que a decisão tenha sido de improcedência, é interessante ver que o judiciário já está gerando precedentes sobre um tema que antes nem sequer era cogitado no ramo jurídico, por muitas vezes ser visto como um mundo de fantasias.
O uso dos avatares abre espaço, também, para discussões sobre como o direito à proteção à honra, à dignidade da pessoa humana, à privacidade, à intimidade, à identidade serão tutelados. Há uma preocupação acerca do tema por não se saber ao certo qual seria a “pessoa” atingida em caso da violação de um desses direitos, seria a pessoa real ou virtual?
Cabe aos operadores do direito analisarem com cautela os comportamentos decorrentes do uso das novas tecnologias. Tratando-se de algo tão real (ao mesmo tempo irreal), que cada vez mais será comumente utilizado, a maioria das problemáticas reais serão levadas ao mundo virtual.

8. Referências Bibliográficas
https://www.totvs.com/blog/inovacoes/o-que-e-inteligenciaartificial/#.YHhb2qdnUZo.link (Acesso em 15/04/2021 – 12h33).

https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-mcti/noticias/2021/04/estrategia-brasileira-de-inteligencia-artificial-e-publicada-no-dou#:~:text=A%20Estrat%C3%A9gia%20Brasileira%20de%20Intelig%C3%AAncia%20Artificial%20tem%20como,de%20pesquisas%20para%20o%20desenvolvimento%20da%20Intelig%C3%AAncia%20Artificial. (Acesso em 11/09/2021 – 11h55).

https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-mcti/transformacaodigital/arquivosinteligenciaartificial/ia_estrategia_documento_referencia_4-979_2021.pdf (Acesso em 11/09/2021 – 12h04)

https://www.internetlab.org.br/pt/privacidade-e-vigilancia/especial-andriei-gutierrez-nos-temos-que-nos-reeducar-a-luz-dessa-nova-era-vai-ser-um-processo-de-educacao-de-formacao-politica/ (Acesso em 11/09/2021 – 12h30)

https://www.bbc.com/portuguese/geral-50228913 (Acesso em 13/09/2021 – 21h35)

https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/05/Inteligencia_artificial_no_poder_judiciario_brasileiro_2019-11-22.pdf (Acesso em 13/09/2021 – 21h49)
https://www.gartner.com/smarterwithgartner/top-trends-on-the-gartner-hype-cycle-for-artificial-intelligence-2019/ (Acesso em 13/09/2021 – 21h50).

https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/1933 (Acesso em 13/09/2021 – 21h59).
rt-1015-vinicius-holanda-melo-e-antonio-jorge-pereira-junior-os-limites-da-inteligencia-artificial.pdf (thomsonreuters.com.br) (Acesso em 13/09/2021 – 22h04)

Por: Gabriel Guerrero de Souza

Graduando em Direito pela Athon Sorocaba. Alumni da World Intellectual Property Organization (WIPO). Técnico em Serviços Jurídicos pelo Centro Paula Souza (CPS).